NEGRO ROM

NEGRO ROM
INICIATIVA QUE RECONHECE A DIFERENÇA

domingo, 10 de janeiro de 2010

Uma Viagem em Busca do Novo


Como surgem as boas idéias? Eis uma pergunta da qual todo escritor gostaria de ter a resposta. Não só a resposta, mas porque não, um esquema simples, uma receita onde se mistura tudo, coloca no forno e... Pronto! Mais uma idéia quentinha, inédita, pronta para ser saboreada.

Uma pena. Nunca existirá uma receita assim. Certamente as boas idéias existem em algum lugar, em alguma realidade distante, e repentinamente somos surpreendidos. Alguns dizem que a hora do banho é sagrada. O banheiro, em geral, é considerado um excelente reduto para as boas idéias. Num momento de ócio somos surpreendidos com pensamentos, visões, sonhos e subitamente percebemos: “Isso pode dar uma história interessante. Vou escrever isso”. E se não escrever... Pode ter certeza, em instantes esquecerá e terá perdido uma dádiva oriunda de um mundo ainda pouco conhecido.
Certa vez percebi que a busca pelo ineditismo é traiçoeira. Pode fazer de um escritor promissor, uma promessa de mediocridade. Lembro-me bem, quando era um leitor compulsivo de revistas em quadrinhos, de uma reunião objetivando a criação de uma história totalmente nova, do tipo “você nunca viu nada parecido antes” (esse era o nosso lema, dito e repetido incontáveis vezes).
A equipe: eu e um amigo desenhista. Ambos escreveriam a história, ele desenharia. Eis um resumo do diálogo:

- Temos que escrever algo novo. Nunca visto antes. Nunca lido antes.
- É verdade. Não podemos abdicar disso.
- Então vamos lá... Esse negócio de super-herói... Temos que tomar cuidado. Você vê... É tudo igual.
- É... Tudo com aqueles uniformes extravagantes...
- Você vai querer escrever sobre super-herói?
- Não sei... Eu estava pensando em escrever algo totalmente novo...
- Eu também...
- E super-herói... Todo mundo escreve sobre super-herói!
- É verdade, o próprio conceito de super-herói... É algo já desgastado, batido.
- Então chegamos num consenso... Nada de super-heróis.
- A gente vai falar sobre o quê... Vejamos...
- Podemos falar sobre pessoas... Não sei...
- Pessoas? Falar sobre pessoas é algo que todo mundo faz... Você quer dizer algo tipo Seinfeld, né?!
- Confesso que sim...
- Tá vendo. É fogo, é difícil mesmo escrever algo novo...
- É... É difícil... Tem que ser algo diferente.
- É... Algo que ninguém nunca viu antes!
- Pessoas a gente vê toda hora... O próprio conceito de pessoas...
- Engraçado... Eu tava pensando nisso agora!
Ambos riram.
- Não podemos escrever sobre pessoas...
- Nem sobre alienígenas!
- É... Alienígenas são criações de pessoas...
- Podem existir...
- Mesmo se não existem concretamente, no imaginário das pessoas...
- É difícil...
- Eu falei que ia ser fogo...
- As formas humanóides não servem... Lembram seres humanos. Lembram a vida terrena... Um tema desgastado! A vida em planetas é um tema desgastado em si...
- Eu pensei nisso... Mesmo se criássemos vida em outro planeta... É tolo!
- Não pode ser planeta... Nem vida... Acho que o caminho é criarmos outros seres, com outros sentidos... Outra forma.
- Criar um sentido... Vejamos...
- Porque se criarmos um ser que tem visão, é meio humano, animal.
- Criar sentidos é algo meio além da minha imaginação... Minha mente não alcança...
- Aí, essa agora... Senti que esse é o caminho! Levar a mente ao inalcançável!

Enfim... O assunto durou muito tempo. Chegamos num ser que era apenas essência. Não tinha forma, e os sentidos criaríamos depois. Não poderia ser uma luz, porque luz existia. Não podia nem ser um ser, porque o conceito de ser... Já imaginaram o que vem a seguir.
Percebemos que tínhamos criado o nada, o vazio. E minutos depois nos demos conta de que o nada também existia! A única coisa que criamos ali, após uma hora de elucubrações inúteis, foi nossa própria incompetência criativa!

Nós éramos ali a promessa de mediocridade que sequer tinha ido para o papel.

Alexandre Lessa.

Nenhum comentário: